quarta-feira, 9 de novembro de 2016
O ogro de lá não é pior que o ogro de cá
É desnecessário afirmar que a vitória de Trump é uma tragédia. Uma tragédia não só para os EUA, mas para o resto do mundo também. Não que com a Hillary as coisas fossem muito melhores, mas, como pessoa, a moral de Donald Trump é algo mesmo digno de admiração do ex-líder do Ku Klux Klan. Aí os reacinhas brasileiros vêm com esse slogan biruta de "BolsoTrump 2018", em referência ao deputado Jair Bolsonaro para presidente em 2018, como se ele e o republicano fossem iguais – apesar das semelhanças.
Ninguém duvida que Trump é um sujeito intolerante, sociopata, racista, machista, homofóbico, islamofóbico, xenófobo e corrupto, mas as semelhanças com o seu "primo pobre" brasileiro param por aí. Bolsonaro, além de ser um clone podre do Trump, é pobre, antipatriota, apaixonado por torturadores, olavete, conspiranóico e impopular. Bolsonaro é uma versão piorada e mendiga do Donald Trump. Fora que os coxinhas dos EUA são um pouquinho mais civilizados que os coxinhas brazucas por ao menos respeitarem a própria pátria e não apoiarem a entrega das riquezas ao capital internacional. Trump é um fascistoide, e fascistas são nacionalistas e intervencionistas – muito diferente dos fascistas brasileiros que odeiam o próprio país e querem entregar todas as nossas riquezas e estatais para o sistema financeiro internacional. O único ponto que Trump tem em comum com os nossos reaças tupiniquins é o conservadorismo e o discurso preconceituoso. Daí que a vitória de Trump para eles é uma vitória sobre os "esquerdopatas e petralhas do Foro de São Paulo". Na cabeça oca deles, ser a favor de liberdades individuais é coisa de "esquerdista", sendo que liberais clássicos como Adam Smith eram defensores incansáveis dessa mesma liberdade.
O fato é que Jair Bolsonaro dificilmente irá se eleger para um cargo no executivo, até porque a realidade do Brasil é diferente da realidade norte-americana. Aqui as eleições são diretas e o voto é obrigatório e majoritário. Um extremista como Bolsonaro que é réu no STF e não conseguiu nem mandar seu filho para o segundo turno das eleições municipais dificilmente conseguirá algo relevante em 2018.
Os espinhos às vezes têm rosas...
Porém, nada na vida é 100% ruim. Como disse certa vez um ex-colega meu: Trump é a pessoa errada com as ideias certas, já a Clinton é a pessoa certa com as ideias erradas. A palavra "pessoa" se referia ao caráter e "ideias", à agenda política. Bem ou mal, Trump representava uma mudança: uma alternativa à possibilidade de uma guerra mundial, à recessão permanente, ao empobrecimento da classe trabalhadora americana e ao rentismo. Trump, apesar de ser um magnata, é um homem que nunca assumiu cargo político e esteve fora dos grandes esquemas imperialistas em prol da plutocracia ianque. Trump derrotou forças poderosas do status quo, como a máquina do próprio partido, os meios de comunicação, Wall Street, as grandes capitais europeias e latino-americanas e organizações internacionais como a OTAN. Ele teve o mérito de captar a insatisfação dos americanos com a atual política, com a crise, com a perda do poder aquisitivo da classe média, com o crescimento do poderio das elites econômicas sobre o povo e com o sistema como um todo. O próprio socialista Bernie Sanders já havia captado essa insatisfação dos eleitores democratas e seria uma alternativa mais vibrante de mudança. Hillary Clinton não representava mudança alguma nesse aspecto, porque ela defendia um modelo economicamente desgastado e decadente fortemente apoiado pela oligarquia estadunidense. Trump, apesar de ser um homem absolutamente imoral, tornou-se a única possibilidade de mudança nesse sentido. E essa mudança causou insatisfação na maioria das elites americanas e internacionais, tanto que a própria Globo – líder das oligarquias brasileiras – fez um editorial em seu jornal contra o Donald Trump. E os coxinhas brasileiros que vivem na ilegalidade nos EUA logo perceberão o erro que cometeram ao apoiar o candidato xenófobo.
A vitória do republicano, apesar de ser essencialmente ruim, também traz um novo ar para renovar a política abafada, imperialista e mofada que imperava no mundo a favor da ganância das velhas oligarquias.
Se resta alguma dúvida do porquê de Trump ter vencido essas eleições, recomendo este brilhante artigo do diretor Michael Moore escrito em julho deste ano.
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