quarta-feira, 22 de novembro de 2023

E esses uniformes sensuais aí, pode isso?

 

No mês passado, mais uma polêmica envolvendo "sexualização excessiva" apareceu na imprensa e ganhou ainda mais notoriedade nas redes sociais. A polêmica foi que as jogadoras dos times femininos do campeonato inglês Aston Villa, Newcastle e Wolverhampton estavam usando uniformes "sensuais demais". Isso porque o material esportivo produzido pela empresa Castore estava fazendo as atletas transpirarem demais e ainda por cima absorviam o suor de forma ineficiente, deixando o uniforme mais pesado (e mais colado ao corpo) do que o habitual. E para ilustrar isso, colocaram propositalmente as fotos e vídeos da atacante suíça Alisha Lehmann com o polêmico uniforme, já que ela possui o corpo mais, digamos, 'avantajado' entre as atletas. Pronto, isso bastou para a liga das senhoras católicas, radfems e nofapistas ficarem bastante exaltados. Sobre essa notícia, eu tenho dois pontos relevantes para destacar.

Usar a Alisha como referência também é covardia.

 

O primeiro ponto é que, sim, a Castore e outros materiais esportivos realmente abusam de tecnologias para sensualizar o máximo possível as atletas. Isso acontece também em outros esportes, como no atletismo e no voleibol, por exemplo, e causa, frequentemente, problemas de mobilidade para as atletas só para elas ficarem mais atraentes para o público masculino. Só que essas marcas não fazem isso por serem meramente sexistas, mas porque é uma forma de chamar mais atenção para o futebol feminino que é menos visto que o masculino por vivemos em uma sociedade machista. Os patrocinadores que colocam seus logotipos nas camisetas e shorts precisam que as marcas sejam vistas pelo maior número possível de pessoas, então os fabricantes fazem o uso dessa "estratégia" para atrair os olhares do público masculino. 

É por isso que eu acho que deviam ser as próprias atletas que tinham que escolher os uniformes que pretendem usar, afinal, são elas – e somente elas – que estarão expostas em um esporte de alto rendimento. Só que enquanto existir machismo e capitalismo, provavelmente essa será uma guerra perdida.

Corpos avantajados chamam atenção em qualquer uniforme.
 

O segundo ponto dessa discussão é o aspecto moral. Mulheres com corpos "perfeitos" sendo expostas na mídia sempre causaram incômodo por impactar na autoestima de adolescentes do sexo feminino. Além de causarem ciúmes em mulheres comprometidas que tem que aturar seus maridos babando para os corpos esculturais da concorrência. Eu entendo isso perfeitamente, mas há uma certa hipocrisia aí. Ninguém problematizou, por exemplo, quando o ex-jogador da seleção masculina de futebol Hulk fez sucesso entre o público feminino e o público gay por seu corpo avantajado. Ou como os super heróis masculinos possuem corpos de bodybuilder expostos em roupas ultra coladas ao corpo. A busca pelo corpo perfeito também faz mal aos homens, já que muitos deles literalmente morrem de tanto tomar esteroides para ficarem com o físico de seus ídolos. 

Mantenha os uniformes e tire a Alisha que acaba a objetificação.

 

No caso dos grupos progressistas, essa hipocrisia moral fica bastante evidente, porque se fosse uma mulher obesa no lugar de uma Alisha Lehmann sendo objetificada ou hipersexualizada, ninguém reclamaria, porque enxergariam isso como "quebra de tabu" e "empoderamento", apesar da situação ser rigorosamente a mesma. Ou se o problema fosse o oposto, o excesso de roupa, ninguém reclamaria também, mesmo que causasse problemas muito piores de mobilidade e desempenho. Apesar que no caso da Alisha ou do Hulk, até se ambos estivessem vestidos com roupas de apicultor iriam chamar atenção. Note, inclusive, que somente a Alisha é usada como referência nas matérias e posts sobre este assunto, porque apesar das demais atletas usarem o mesmo uniforme, elas não incomodam o povo por terem corpos "comuns". O que incomoda os moralistas não é o uniforme em si, mas os corpos "perfeitos" expostos. Ou seja, se a Alisha não jogasse no Aston Villa, ninguém nem estaria falando sobre este assunto. Esse aspecto parcial tira toda a seriedade do debate.

Então é preciso ter um ponto de equilíbrio nessas discussões para que possamos buscar soluções reais e não soluções simplistas baseadas em moralismo cínico.

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