Esta postagem marca o início de uma nova série neste blog: uma série sobre os jogos de videogame que foram mais importantes na minha vida. Ao contrário do que dizem os mal humorados, os games são, sim, uma forma de arte. Da mesma forma que um filme ou uma música podem marcar as nossas vidas, um bom jogo de videogame também pode ser inesquecível. Por isso, os jogos que serão mostrados nesta série serão tratados como verdadeiras obras de arte.
Esta série não terá uma sequência linear, sendo publicada aleatoriamente quando eu tiver vontade de escrever sobre algum jogo específico. Eu farei uma abordagem que irá incluir uma análise e as razões pelas quais esses jogos marcaram a minha vida. E o primeiro jogo desta série será um dos melhores e mais imersivos que joguei em toda a minha vida, o maravilhoso Life is Strange (ou LiS).
Max (à esquerda) e Chloe (de cabelo azul) são as personagens centrais do game |
Lembro-me que quando ouvi falar deste jogo pela primeira vez, já me senti impulsionado a conhecê-lo. Jogos que simulam a vida real, que possuem um bom enredo e que nos dão escolhas que levam a consequências sempre me atraíram. Jogos como Heavy Rain, Beyond Two Souls e Last of Us são exemplos disso. Apesar de nunca ter jogados esses três games por eles serem exclusivos do Playstation, eu sempre tive muita vontade de vivenciar suas histórias. Enfim, o fato, como citei, é que a ideia do game Life is Strange me atraiu logo de cara, principalmente por ele ter sido inspirado no meu filme favorito, o Efeito Borboleta.
Pois bem, comprei Life is Strange numa promoção da Steam em meados de 2016 quando os cinco episódios da série já haviam sido lançados. Comprei todos os episódios de uma só vez junto com Rise of The Tomb Raider e resolvi jogar esses dois games paralelamente, já que o game da Lara Croft também me gerou expectativas boas. O fato foi que Life is Strange me pegou pelo coração. Enquanto eu me entediava com a mesmice de Rise of The Tomb Raider (que a nível de enredo é inferior ao de 2013), eu me encantava cada vez mais com o belíssimo game da Dontnod Entertainment. No fim das contas, fiquei jogando só o Life e deixei o Tomb pra lá (desculpa Lara).
A amizade entre amigas de infância é algo bem explorado no game |
O game
Life is Strange é um game de drama e suspense protagonizado pela estudante Max Caulfield, uma recém chegada no curso de fotografia da renomada Blackwell Academy, que fica na pequena cidade litorânea de Arcadia Bay. O enredo gira em torno de dramas adolescentes, intrigas familiares, amizade, romance, drogas, assédio, abuso, bullying, suicídio, eutanásia, viagens no tempo, teoria do caos, efeito borboleta, bissexualidade e algumas reviravoltas e surpresas na história. É um enredo complexo e muito bem escrito. As músicas do jogo são muito boas e a dublagem é maravilhosa. O que temos no fim das contas é uma espécie de filme interativo, onde interagimos com pessoas e objetos de forma muito semelhante a um RPG. O game pode parecer parado e monótono para quem gosta de ação, mas como o objetivo do jogo é envolver emocionalmente o jogador, quem for jogar este game deve estar ciente que ele não tem a proposta de atingir o público alvo 'hard gamer'. Este game é uma obra de arte que deve ser desfrutada nos mínimos detalhes e com a sensibilidade ativada no nível máximo para captar cada pequena sutileza do enredo.
O bullying é um dos temas abordados no game |
Minhas impressões
Logo no início deste game eu tive um déjà vu muito bacana quando vi a sala de aula de Max Caulfield. A sala com janelas grandes, mesas grandes e cheia de cartazes me lembrou muito o meu primeiro período na faculdade de desenho industrial. Talvez pelo curso de fotografia estar num ramo muito próximo ao do design, tenham tantos elementos em comum entre um e outro.
Eu também me identifiquei muito com a protagonista Max, porque apesar dela ser uma adolescente meia ingênua, ela se parece muito comigo, porque ela é nerd, hipster, introvertida, tímida, enxerida, fala sozinha, não bebe, não fuma, toca violão e ama a natureza. Max tem um grande coração e a simplicidade dela é muito cativante. Em contraste com ela vem a sua antiga amiga de infância Chloe Price, que é quase o oposto dela e virou uma "rebelde sem causa" após a perda do pai. Falando na Chloe, é ela que desperta a habilidade de voltar no tempo de sua amiga Max em um incidente trágico dentro do banheiro da academia. Apesar de ser meio doidona, Chloe também tem um coração de ouro. A amizade entre Chloe e Max, apesar dos altos e baixos, é muito bonita e mostra uma união muito forte e leal entre personagens femininas – fato que eu nunca vi ser tão bem representado em um jogo de videogame. Há um texto que achei na internet que traduz de forma bem gostosa e sincera a beleza de uma antiga amizade de infância entre duas mulheres. A cumplicidade entre Chloe e Max é tanta, que acaba envolvendo o jogador e fazendo ele se sentir parte do enredo, criando uma conexão poderosa entre quem joga e as personagens. Muitas pessoas consideram o game como sendo feminista não apenas por passar fácil no Teste de Bechdel, mas por abordar temas muito discutidos entre feministas e ter mulheres como protagonistas.
É notável que o game vai ficando cada vez mais denso e angustiante à medida que a história avança, de modo que os dois últimos episódios são os mais pesados e tensos. Algumas verdades chocantes vêm à tona e certas surpresas aparecem de forma estarrecedora, o que torna o game ainda mais imersivo e imprevisível.
Ocorreram alguns momentos no game em que eu fiquei com os olhos cheios de lágrimas porque há um apelo emocional muito forte e você se sente parte de tudo aquilo. Este game foi primeiro jogo de videogame que me emocionou de verdade, e olha que eu sou um marmanjo com mais de trinta anos que tomou muita porrada da vida. Isso prova que é possível criar um jogo que seja belo, divertido, emocionante, imersivo e inesquecível sem precisar apelar para gráficos estupendos ou ação desenfreada. Apesar dos mal humorados andarem dizendo por aí que o game é um "simulador de depressão cheio de marasmo", acho que ele está mais para uma novela teen feita para nos fazer rir e chorar. O game traz uma mistura de sentimentos bons e ruins que tocam as pessoas mais sensíveis devido a sua sutileza.
Os momentos tristes do jogo são de partir o coração |
O final
Os finais de Life is Strange estão entre os melhores que já vi em um jogo de videogame. O game impõe um dilema moral muito cruel no final, dando a opção entre dois finais muito tristes. Um dos finais é meio frustrante, já o outro é bem amargo. O mais dolorido deles é capaz de despertar a criancinha chorona dentro do jogador por mexer justamente onde dói mais. Algumas pessoas consideram os finais polêmicos, mas na minha opinião eles são coerentes com as escolhas que fazemos ao longo do game. O fato é que vale, sim, jogar todo o game para se deparar com o resultado final da história vivida por você. O interessante seria terminar o jogo duas vezes escolhendo os dois finais diferentes.
Por que este game foi inesquecível?
Este game tem o mérito de fazer o jogador se apegar aos personagens e se envolver com o enredo. Nós nos tornamos agentes ativos na história e tudo que fazemos traz consequências. É divertido e surpreendente ver a reação dos personagens a nossas ações, ainda mais quando podemos voltar no tempo e desfazer as ações anteriores. Mas o que realmente me impressionou em Life is Strange foram as lições de vida que o jogo passa indiretamente. Aspectos como o valor da amizade, a importância do respeito às pessoas, o sexismo, o perigo das drogas, os abusos contra as mulheres e outros temas bastante recorrentes em discussões progressistas nos mostram uma parte cruel da realidade que precisa ser posta em debate. Além de emocionar, Life is Strange ajuda o jogador a refletir sobre vários fatos da vida. E acho que só por isso já vale a pena ter essa obra de arte na sua coleção. A experiência pessoal que este game traz é única devido às reflexões que ele nos induz a fazer.
Max descobrindo seus super poderes pela primeira vez |
Para terminar, deixo o melhor trailer que vi do game, criado por um fã e inspirado na abertura do seriado Friends.
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