Já dizia célebre canção Como Nossos Pais – escrita por Belchior e imortalizada na voz de Elis Regina – que "viver é melhor que sonhar". Mas será mesmo que viver é realmente melhor que sonhar? Há muitas formas de se interpretar essa frase, mas para este post, vou focar na visão mais prática e direta: de que sonhar com algo é melhor que vivenciá-lo na prática.
Pode parecer estúpido crer que uma situação imaginária, feérica ou onírica seja melhor que a experiência de vivenciá-la de fato. Afinal de contas, sonhos são fantasia, um devaneio de uma única mente. Já a realidade é algo tangível: algo que "sonhamos" juntos. Claro que o próprio conceito de realidade é muito particular, porque nada garante que este mundo seja de fato real. Mas para o bem da argumentação, vamos considerar que o que vivemos fora de nossas mentes aqui na Terra seja a realidade objetiva. Então, será mesmo que a realidade é algo tão melhor que o sonho?
Acredito que o(a) caro(a) leitor(a) – ou carx leitorx, se preferir – já deva ter perdido o "BV" (Boca Virgem, para quem pensou outra coisa). Todo mundo já beijou na boca, certo? Mas antes do seu primeiro beijo, como você imaginava que ele seria em seus sonhos? Provavelmente, algo melhor do que você vivenciou na realidade. Bom, pelo menos meu primeiro beijo foi horrível. A pessoa que beijei estava com mau hálito e nossos dentes se bateram. Detestei a experiência. O mesmo pode se aplicar a outras coisas. Tudo que criamos uma expectativa boa pode ser desastrosamente pior que o imaginado nos sonhos. Se você sonha em fazer a sua 'viagem dos sonhos' (perdão pela redundância) para Paris, por exemplo, no seu sonho, você se imagina fazendo selfies num belo dia ensolarado na cidade da luz. Mas, na realidade, quando você viaja de fato para lá, acaba ficando preso em um longo engarrafamento, se estressando no despache da bagagem, indo à Torre Eiffel num dia muito chuvoso, tendo uma diarreia horrorosa no meio de uma excursão, sentindo medo de uma multidão fazendo protesto nas ruas e ainda é hostilizado no supermercado por xenófobos locais. Claro que nem tudo é tão trágico, só que em nossos sonhos, nada chega a ser tão terrível. Só idealizamos coisas boas em nossos sonhos.
É por isso que sonhar é muito melhor que viver. No sonho, nós somos quem queremos ser e não apenas quem podemos ser. É na dimensão dos sonhos que tudo se torna possível por mais absurdo que seja. O nosso sonho pode ser irreal para os outros, mas para quem os vive de forma intensa, ele pode ser tão pleno quanto a própria realidade. Mas o grande barato do sonho é que ele além de não possuir qualquer limite ou regras, também funciona como uma droga, como um ansiolítico. O sonho pode ser usado como fuga da realidade para suportarmos momentos difíceis e dolorosos de nossas vidas. No meu caso, os sonhos mais lindos que tive foram justamente nos momentos em que a realidade era mais dolorosa e opressora. É por isso que pelo menos para mim, sonhar é mais divertido que viver e ainda é de graça.