Apesar de nunca ter feito menção alguma sobre este assunto aqui neste blog, eu criei ao longo dos últimos vinte anos uma batelada de bandas de rock fictícias para a estória de um livro/quadrinho/desenho que se chamaria Sociedade do Rock. Esse livro/desenho teria, como o próprio nome sugere, a trama de várias bandas de rock brasileiras e de seus integrantes rumo ao sucesso. Eu cheguei a esboçar algumas tirinhas e a criar algumas ilustrações dessa história fictícia, produzindo o roteiro, criando os personagens, inventando bandas e até compondo músicas para essas bandas de acordo com estilo de cada uma. Foram dezenas de bandas e centenas de personagens que contavam em tempo real o que se passava num Brasil de um universo paralelo idêntico ao nosso. Tinham bandas de punk rock, de hard rock, de metal e de pop rock nessa história que mostrava a trajetória e o planejamento dos músicos e produtores desde a formação inicial até o fim das mesmas. Mas de todas as bandas que criei, a principal e mais famosa era, sem dúvidas, a banda de pop/rock chamada Unno, cujo nome veio em um sonho junto com a capa do primeiro EP dela. E é justamente em torno desta banda que a história principal girava.
Pois bem, como não tive como conciliar a criação dessa história com outros projetos pessoais, acabei o engavetando durante os últimos anos, mas a história da Sociedade do Rock está pré-escrita, esperando apenas por um pouco de tempo e recursos para ser retomada. Enfim, mas não é sobre isso que este post se trata, mas sim sobre a riquíssima história por trás da banda Unno.
Os lendários integrantes da Unno: Tom, Ellie, Klindo, Panther e Hiroshi |
A história por trás da Unno
Criada no ano 2000, a Unno era uma banda progressista paulistana que tinha uma história incrível e reunia remanescentes de outras duas bandas – a DeterGente e a Wacas Malhadas – que se uniram em torno de um projeto em comum. O nome Unno veio veio justamente daí: da união dessas duas antigas bandas. Os cinco integrantes principais da banda – Klindo (Plínio Kloid), Ellie (Elisângela Santana), Panther (Mauro Oliveira), Tom (Tomás Pelegrini) e Max (Higor Sampaio, substituído depois por Hiroshi) – traziam personalidades únicas e tinham suas histórias contadas a partir do próprio ponto de vista deles. Cada um desses personagens foi criado com todo carinho e atenção nos mínimos detalhes, incluindo defeitos, qualidades, manias, sotaques, ideias, sonhos, família, ideologia, espiritualidade, posicionamento político e até grupo sanguíneo.
Enfim, o que eu quero chamar atenção com esta postagem não é nem para a banda, nem para o quadrinho, nem para a história e nem para as músicas: mas, sim, para a importância vital que a banda teve para o contexto social e político dentro do universo em que ela estava inserida.
Desenho à mão da Unno feito em 2002 |
A Unno e a reinvenção do amor
A Unno durou ao todo dez anos, de 2000 até 2010, e lançou oficialmente sete discos, sendo um deles de coletânea (lançado em 2011), um ao vivo e um acústico. O primeiro álbum da banda, lançado em março de 2001, foi disparado o mais vendido graças ao alto investimento e ao belíssimo trabalho por trás dele que envolvia financiadores, publicitários, empresários, produtores, técnicos, figurinistas, luthiers, estilistas e designers. Este primeiro álbum, intitulado A Reinvenção do Amor, tinha músicas que seguiam uma ordem cronológica em cima de um fio condutor central que era a solidariedade. Nesta época, a caçula e única garota da banda, a Ellie, tinha um irmãozinho que estava com leucemia e precisava de um transplante de medula óssea para poder continuar vivo. Foi aí que seus companheiros de banda, produtores, empresários e financiadores tiveram a ideia de usar a doação como tema central do disco para incentivar as pessoas a doarem sangue, órgãos e, claro, medula óssea. E a magia da história do primeiro disco está justamente nisso: na capacidade de mover uma legião de pessoas para o bem.
Eu tive o trabalho de compor várias canções para a banda que tinham como foco a solidariedade, a doação, a adoção, o carinho, a amizade, o respeito, a empatia, o altruísmo, a esperança, a tolerância, o perdão, a caridade e, sobretudo, o amor. Por isso, o nome do disco era A Reinvenção do Amor. Entre as canções, uma abordava a infância perdida num hospital, outra abordava a velhice em um asilo, outra falava do amor aos animais, outra da saudade dos entes queridos que se foram, outra da perda de um filho... mas a música mais importante do disco era Essa Chama Não Pode Apagar, porque ela falava de como todos nós podemos nos tornar imortais nos corações que deixamos para trás – mas não apenas isso: essa música era um verdadeiro hino de tudo que as pessoas mais precisam fazer hoje: amar uns aos outros.
A canção Essa Chama Não Pode Apagar surgiu em um sonho meu. O início da canção, sei lá como, já veio pronto no meu subconsciente: "Eu quero inventar um sentimento em que todos possam acreditar, construir um mundo sem fronteiras, ser criança para saber perdoar". Essa canção sintetiza tudo que mais falta hoje no mundo: respeito, tolerância, solidariedade e amor.
Primeiro EP da banda lançado em 2000 revelado num sonho |
Este primeiro disco da Unno foi, dentro da estória, responsável por uma onda de solidariedade que conectou todos os fãs e até mesmo as pessoas que não curtiam as músicas da banda. A transformação social a partir da Reinvenção do Amor foi algo comovente, porque ajudou a salvar muitas vidas, engajou ONGs, mobilizou pessoas em campanhas de solidariedade e uniu os diferentes em nome de um bem maior. Dando um spoiler da história, o irmão caçula da Ellie foi salvo por uma doação de medula graças justamente a essa campanha, mostrando que quando as pessoas se unem por um ideal, é muito mais fácil alcançá-lo. Pois como bem questionou Bob Marley certa vez: "se todos nós dermos as mãos, quem sacará as armas?"
Férias da banda desenhada à mão em 2003 |
O legado da Unno
O motivo de ter escrito este post em meio à turbulência política que estamos vivendo foi justamente porque há algumas semanas atrás eu sonhei que estava assistindo a um show da Unno em Salvador, onde a banda se reuniu novamente oito anos após o seu fim para homenagear o mestre Moa do Katendê e todas as vítimas da intolerância e do fascismo que tem crescido sem controle no Brasil. Foi incrível ver meus próprios personagens ao vivo pedindo para que as pessoas abracem a causa que eles sempre defenderam: o diálogo, a diplomacia, a cordialidade, o respeito e a solidariedade. Eu sinto como se a Unno, seus integrantes e todas as ideias que ela defende estivessem vivos de verdade dentro de mim. Daí me vi na obrigação de divulgar tudo isso como forma de mostrar a necessidade urgente que há de se criar um fio condutor social baseado na solidariedade e no respeito mútuo. Precisamos reinventar o amor e a nós mesmos também.
Nos discos seguintes ao fabuloso A Reinvenção do Amor, o tom mudou um pouco e banda ficou menos pop e mais rock n roll. O segundo disco, o Ideias Profanas, lançado em 2004, foi considerado o álbum mais "esquerdista" da história do rock devido às suas críticas ácidas ao capitalismo, às religiões, ao patriarcado, ao racismo, à heteronormatividade, aos plutocratas e ao pensamento reacionário que hoje virou moda no Brasil. O som havia ficado muito mais pesado com uma pegada mais punk/hard rock, ressaltando lado rebelde da banda. Este segundo álbum foi produzido por uma gravadora independente nos Estados Unidos, porque a gravadora brasileira que produziu o primeiro disco (a Pop Records) o considerou "antipop" e "subversivo demais" para ser viável comercialmente. E, de fato, este álbum vendeu muito menos que o primeiro, até porque suas canções foram muito boicotadas pelas rádios e pela televisão devido às suas críticas perigosas ao sistema.
O terceiro e o quarto disco (de 2006 e 2008, respectivamente) seguiram por um caminho mais alternativo, com um rock mais refinado, mas mantendo a pegada pop do primeiro álbum por razões comerciais. No final de 2008, Ellie deixou a banda para seguir carreira solo. Em 2009, Klindo, o personagem mais polêmico e carismático da história, deixou a banda após muitas brigas e confusões mundo afora (vou escrever um post só sobre ele, porque ele merece). E em 2010, Tom Pelegrini, o coração da banda, deixou a Unno para tratar de um câncer na tireoide, o que causou o fim da banda. E agora, em 2018, eles resolveram se reunir no meu sonho (à exceção do Klindo que hoje mora nos EUA) para trazer uma mensagem de esperança e amor para a humanidade. É por isso que eu digo que a Unno foi a maior banda de rock que jamais existiu.
Namastê!
É disso que eu estou falando! |
Wellington você já ouviu Sabaton, Powerwolf ou alguma outra banda de power metal? Se ouviu o que acha delas?
ResponderExcluirNão ouvi ainda. Aliás, tenho escutado muito pouca música nos últimos anos.
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