quarta-feira, 4 de agosto de 2021

A solução para a "objetificação sexual"


Toda sociedade humana ao longo da história teve os seus próprios padrões de beleza. Durante a pré-história, por exemplo, onde tínhamos longos períodos de escassez de alimentos, uma pessoa gorda era considerada muito atraente. Isso se mostra verdade nas esculturas e pinturas daquele período. Ser gordo ou gorda naquela época era atraente justamente por ser difícil conseguir estocar energia em forma de gordura numa época de miséria. Se você olhar para algumas culturas africanas do século passado, as pessoas mais atraentes fisicamente eram as mais barrigudas justamente por ser difícil engordar vivendo apenas de caça e coleta. Já no ocidente contemporâneo, o padrão de beleza está ligado ao físico magro e atlético. Isso porque ser magro e ter o corpo sarado numa época de comodidade e alta oferta de alimentos é algo que exige esforço e custa caro. Obviamente, se aproveitando disso, os capitalistas passaram a vender tudo quanto é tipo de produto para emagrecer, ser fitness e ganhar músculos. No caso das mulheres, essa exigência é ainda mais cruel, porque celulites, estrias e até marcas de expressão são tratadas como "imperfeições". A insatisfação com o corpo é uma estratégia de venda capitalista. O nosso padrão de beleza prova isso o tempo todo e ele tende a ser cada vez mais implacável. E, nesse contexto atual, temos a publicidade e a moda explorando à exaustão corpos que reforçam esses estereótipos quase inalcançáveis de beleza. É justamente daí que nascem os principais problemas ligados a "objetificação" e "hipersexualização".

Ser tratado APENAS como um corpo a ser desejado não é empoderador.

Mas a coisa ainda piora um pouco, porque a nossa sociedade é machista e racista. Se duvida disso, basta olhar para as nossas elites. A elite econômica é formada por 99% de homens brancos. A elite intelectual também é formada em sua maioria por homens brancos. Você olha para os altos oficiais das Forças Armadas, a tal elite militar, e 99% deles são de homens brancos. Olhe para a elite política e está lá a maioria formada por homens brancos. A elite religiosa, seja ela católica ou evangélica, 99% é de homens brancos no alto escalão. Ou seja, nos cargos de poder quase não há mulheres e negros. Agora junte o padrão de beleza inalcançável com essa ausência de negros e mulheres no topo da pirâmide social que o problema da objetificação sexual vira motivo de discussão recorrente nas redes sociais. Afinal, ser tratado exclusivamente como um corpo a ser desejado não traz justiça social. Por mais que homens brancos também tenham seus corpos sexualizados, eles, como classe, possuem privilégios que os permitem nãos erem vistos apenas como corpos a serem "consumidos".

Eis aí a raiz do problema.

Agora pare e pense um pouco. Mulheres negras não podem se tornar presidentes ou oligarcas, mas podem dançar seminuas na televisão. Homens negros não podem ser bilionários ou generais, mas podem expor seus corpos sarados em outdoors de filtro solar. Isso gera uma indignação por parte de muitas pessoas, porque sentem que mulheres e negros só servem para isso. E mesmo que homens brancos sejam objetificados, como citei anteriormente, isso não gera tanta revolta por não ser algo exclusivista para eles. Então o problema todo envolvendo a objetificação e hipersexualização não é a sensualidade e nem a beleza, mas a padronização de corpos e a desigualdade social que negros e mulheres sofrem. Ou seja, o problema real são o machismo e o racismo. E no caso das mulheres há um ingrediente a mais que é a cultura de assédio sexual contra elas. A exploração da sensualidade feminina de forma excessiva acaba reforçando em mentes mais imaturas a ideia de que as mulheres não passam de seres exclusivamente sexuais.

Qual é o limite saudável da sexualização?

A caçada de muitas pessoas contra essa sexualização exagerada faz sentido quando se apresenta o contexto social e cultural da situação, mas às vezes alguns protestos passam do limite. Ficar procurando qualquer sinal mínimo de sensualidade em todo canto para criticar é um exagero desnecessário e paranoico. E é claro que há muito moralismo cristão barato por trás de muitos argumentos anti-objetificação. A 'liga das senhoras católicas' infiltrada em movimentos progressistas está sempre denunciando a conspiração diabólica de corpos seminus e posições provocantes, porque, creio eu, que aquela conversa de "pecado contra a pureza" não cola mais há muito tempo. O ponto que eu discordo e que me faz comprar briga com essa galera é que o grande problema não está nem na objetificação e nem na hipersexualização. O problema, como deixei claro anteriormente, é a desigualdade que há entre homens, mulheres, brancos e negros. Além, claro, do padrão de beleza inalcançável e da cultura de assédio. Então a minha solução para isso serve para separar os moralistas cristãos dos progressistas que atuam nessa causa. A solução nada mais é que promover uma maior ocupação de mulheres e negros nas elites e a exposição de MAIS corpos fora do padrão de beleza. Ou seja: combater o machismo, o racismo e o assédio, além de mostrar todos os tipos de corpos sensualizando e mostrando seus atributos na tevê e na publicidade. Pessoas fora do padrão de beleza também precisam se sentir representadas e atraentes. Isso ajuda a trazer autoestima e diminui a sensação de injustiça.

Objetificação sexual ou emancipação? Você decide.

E, por favor, vamos deixar de hipocrisia também. Ninguém normal é contra as pessoas irem de sunga e biquíni para a praia ou dançar sem roupa íntima em baile funk, então não faz sentido algum ser contra uma publicidade inclusiva com corpos seminus, danças sensuais ou uma sexualização natural em filmes, games e revistas. Se todos os tipos de corpos são mostrados de forma igual e não há desigualdade social entre as pessoas, ficar implicando com sensualidade é pura idiotice moralista. Esses argumentos contra toda essa coisa do corpo sexualizado foram muito usados pela igreja católica na Idade Média e também durante a ditadura militar no Brasil. Se você se considera progressista, por favor, fuja disso e lute contra os problemas certos. Mas se mesmo assim você continuar sendo contra peito, bunda e barriga de fora, te recomendo ir morar em países muçulmanos radicais, porque lá não há nenhum espaço para sexualização de ninguém, especialmente das mulheres.

Representatividade de corpos "normais" é a palavra chave.

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