Se não pode derrotar seus "inimigos", então se alie a eles |
Recentemente, vi pessoas de esquerda preocupadas com as tentativas da direita (neo)liberal em atrair para o seu lado os movimentos de grupos oprimidos que têm feito parte majoritariamente da esquerda política. Grupos como o movimento negro, o feminismo, a comunidade LGBT, os ateus e até os veganos têm sofrido assédios (no bom sentido) e incentivos para apoiarem ideias neoliberais.
Pois bem, não vejo nada demais nisso. Os liberais – ou, mais precisamente, os miguxos da direita neoliberal – estão deixando de ser toscos e, ao invés de atacarem esses movimentos "marxistas", estão tentando trazê-los para seu lado. Não há nada de errado nisso, porque a política funciona assim. Ao invés de serem debiloides como a direita cristã reacionária que demoniza as minorias acusando-as de serem "gramscianas", eles resolveram, sabiamente, transformá-las em aliadas. É aquela coisa, se você não pode derrotar um inimigo, se alie a ele. E isso, queira ou não, é uma grande lição para esquerda. Vou explicar o porquê.
A esquerda brasileira tem, ao longo da história, se preocupado em atacar os alicerces da direita, o que, na minha humilde opinião, foi um erro. O arcabouço ideológico da esquerda sempre teve aquela visão coletivista, antiteísta, anticapitalista, revolucionária e contra a família tradicional. Esses aspectos, apesar de serem lemas da esquerda até hoje, tiveram o inconveniente de afastar muitas pessoas mais moderadas ou apartidárias da causa porque elas consideravam essas ideias radicais demais. Em um país de histórico aristocrata, colonial, escravocrata, capitalista, individualista, consumista, macarthista e que teve uma longa ditadura militar, não se pode achar que da noite para o dia as pessoas se "esquerdariam". A prova está aí até hoje com esse fascismo esquerdofóbico que temos na internet e que é comum entre olavetes, zumbis do PIG, neoliberalecos e anarcomiguxos. Não é possível aderir à cartilha de Marx ao pé da letra porque o Brasil não se adapta às características culturais do socialismo. Então o que a esquerda precisa fazer é usar aquilo que sempre foi alicerce fundamental e monopólio da direita a seu favor: família tradicional, empreendedorismo e religião.
Família, tradição e propriedade
Sim, falta essa preocupação por parte da esquerda com a família que mais predomina nos lares brasileiros, que é a "tradicional". A família "tradicional" (papai, mamãe e filhinhos) ainda é tratada como a família "ideal" para muitos brasileiros. Não se deve tratar com desdém o fato de que famílias desestruturadas, com pai ausente, com violência, com alcoolismo, com drogas, com pobreza e sem valores éticos estão causando problemas para a sociedade. Veja bem: não estou dizendo aqui que temos que atacar ou desprezar as famílias com país homossexuais, o que temos que fazer é mostrar que enfatizamos também famílias nos moldes mais conservadores. Essas famílias que prezam pelo tradicionalismo não podem se sentir excluídas pela esquerda. Essas famílias precisam ter um amparo especial, assim como todos os outros tipos de família: ela precisa se sentir acolhida, e não excluída. A esquerda precisa incluir esse discurso pró-família que tem sido monopólio da direita. Isso acaba nos levando também a outro aspecto tratado com desdém pela esquerda: a religião.
A religião – assim como o esporte e a educação – é uma maneira de afastar os nossos jovens das drogas e da violência. É preciso acabar com esse preconceito com o eleitorado evangélico, católico e espírita por achar que eles são massa de manobra acéfala de pastores e padres. Precisamos cativar esse público que também necessita de cuidados e de políticas públicas.
Também é preciso parar de demonizar todo e qualquer discurso individualista. O discurso das igrejas para cativar os fiéis foca nos indivíduos, e não no coletivo. Isso encanta, isso seduz muitas pessoas pobres que têm um projeto pessoal de vida. Valorizar a autonomia do indivíduo não é coisa exclusiva de neoliberal. Torná-lo forte diante das dificuldades da vida não é um dogma da direita e isso precisa ser apropriado pela esquerda de certa forma. O valor moral do indivíduo precisa ser valorizado, seu projeto de vida, sua privacidade. A esquerda precisa entender que há muitos pobres que querem empreender, que querem ter seu negócio, que querem se afirmar como indivíduos. Focar exclusivamente em sindicatos, no proletariado e no coletivo é uma estratégia que limita as possibilidades de se ampliar a felicidade e a liberdade das pessoas.
Enfim, a esquerda precisa parar ficar de mimimi e partir para o ataque também. Isso é política e em política ganha quem consegue o discurso mais conciliador e mais inclusivo. Se não pode derrotar os seus inimigos, se alie a eles.
Para saber mais:
El País: Há cegueira da esquerda para entender a nova classe trabalhadora
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