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Cena do filme: Tropa de Elite 2 onde o traficante 'Beirada' é morto pelo BOPE |
Existe um tipo de pensamento muito comum na nossa sociedade que leva as pessoas a repetirem - quase inconscientemente - aquela velha ideia de que bandido bom é bandido morto. Porém, eu alerto que este tipo de pensamento é extremamente perigoso. Não apenas no caso da polícia matar indiscriminadamente bandidos, mas também com relação à justiça feita pelas próprias mãos.
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Linchamento: uma herança da paleolítica Lei de Talião |
Injustiça pelas próprias mãos
Nós vivemos em um país onde há muita criminalidade, violência, impunidade e insegurança. E em um cenário como este é de se esperar que quando um bandido seja morto ou linchado pela população, as pessoas aplaudam, apoiem e o pior: incentivem este tipo atitude. Esta catarse social - apimentada por um boa dose de sadismo - acaba por causar uma euforia incontrolável por parte da população reprimida pela violência.
O problema é que a justiça feita pelas próprias mãos não é um ato promulgado pelo Estado, logo, trata-se de um delito como outro qualquer. Quem mata um ladrão - a salvo em casos de legítima defesa - está cometendo um crime de assassinato. Ou seja: é um crime usado para combater outro crime. Só que isso gera um outro problema: os familiares, amigos ou comparsas do bandido morto podem querer vingança e aí começa um ciclo sem fim de violência e retaliações. E adicione aí o risco de matar ou de punir injustamente algum inocente que, porventura, venha a ser confundido com um criminoso.
Além de tudo isso, todos têm direito à defesa. A população não pode fazer um julgamento baseada em sua fúria ou em suas convicções pessoais. A função de punir um infrator é do Estado e dos seus membros devidamente instituídos para tal fim.
Enfim, justiça com as próprias mãos não é justiça, é crime. E tentar punir a violência com mais violência é como tentar apagar fogo com gasolina.
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Bandido fardado espancando criança |
Quando a polícia vira a vilã
A dever da polícia é fazer com que a lei seja cumprida, fato. E a lei brasileira não afirma que os policiais têm o poder de julgar e executar os bandidos, pois esta função cabe ao poder judiciário do Estado. Quando um grupo de policiais mata um bandido rendido, indefeso e subjugado, esta atitude - apesar ser aplaudida pela população - está dando motivação para que organizações como o PCC, por exemplo, criem movimentos contra as injustiças do Estado. O estatuto do PCC, para quem não sabe, inclui a honra, a lealdade e a luta pela justiça, pois do ponto de vista dos criminosos, o Estado é o opressor. A visão do Estado e da polícia passada para muitas camadas desfavorecidas da população é de truculência e covardia. Se o Estado cumprisse corretamente o seu papel, organizações criminosas não precisariam criar ideologias que, segundo eles, defendem a justiça.
Os policiais corruptos, assassinos e covardes são, muitas vezes, piores que os próprios bandidos. E, para piorar, cria-se uma atmosfera de limpeza étnica, pois quase sempre são pessoas das classes mais baixas que são torturadas e mortas pela polícia.
É claro que não estou aqui dizendo que os policiais não podem matar bandidos: eles podem e devem, mas nos casos que são permitidos pela lei. A polícia não deve ter o mesmo comportamento dos bandidos, pois a mesma têm (ou deveria ter) ética. E quando a polícia usa a violência contra a população, a quem devemos pedir socorro? Para a polícia?
Portanto, deve-se combater esse pensamento de que bandido bom é bandido morto. Quando estamos lidando com seres humanos, valores devem ser cuidadosamente levados em consideração para que a justiça não vire injustiça. Bandidos devem ser punidos, sim - isso não se discute - mas devem ser punidos de acordo com a lei.
A seguir, indico dois vídeos dos vloggers Cauê Moura e Guilherme Tomishiyo que falam mais sobre esse tema:
Links externos:
Estatuto do PCC