terça-feira, 1 de outubro de 2019

A violência contra negros e pobres não é fruto do acaso


Durante uma apresentação histórica no Rock In Rio 2019, uma das minhas cantoras favoritas – a maravilhosa Elza Soares – soltou o verbo, dizendo tudo aquilo que estava entalado na garganta de muitos de nós: “Ágatha Félix tinha 8 anos, o músico Evaldo Rosa levou 80 tiros, Marielle lutava pelos pobres, pelos negros, pelos pretos, pelo nosso povo. Chega! Chega de perseguir os negros, chega de perseguir os pobres. Mulher negra, coragem, pra frente!”. Em outro momento do show, Elza destinou seu discurso às mulheres e protestou contra a violência doméstica. “Mulheres, a história agora é outra. Gemer, só de prazer. Chega de sofrer calada. Denuncie, por favor! É 180 neles. Machistas não passarão!”. E foi nesse contexto que eu me lembrei que essa violência brutal que existe contra negros, pobres e mulheres é uma constante dentro do sistema mais desumano da história: o capitalismo. O capitalismo sempre naturalizou e lucrou com a violência, porque ela vende armas, aumenta o lucro do tráfico e ganha glamour nas artes.


A violência contra negros e pobres, ao contrário do que alguns "liberais" imaginam, não é natural e nem fruto do acaso. A violência contra essas pessoas é consequência da naturalização das injustiças sociais criadas intencionalmente pela nossa burguesia. Os pobres e negros que morrem às centenas todos os dias nas periferias do nosso país são vítimas de políticas propositais de exploração, de desigualdade, de desemprego e de racismo. O traficante pobre que se esconde no morro, por exemplo, é apenas o varejista que fornece a droga para o consumidor final. Para ele há punição severa: a morte violenta. Enquanto que para os verdadeiros donos do negócio: os grandes traficantes responsáveis pela produção, plantio, transporte e refino das drogas resta sempre a impunidade por serem ricos.
A humanidade dos grupos socialmente desfavorecidos é destruída por essa nossa cultura de indiferença e de desigualdade, legitimando, dessa maneira, a violência (física e simbólica) contra todos os oprimidos no capitalismo. Temos que destruir essa cultura de exploração, de individualismo, de concorrência. Enquanto o capitalismo predatório existir, essa missão de combater as desigualdades será impossível. Portanto, a luta contra o racismo é, no fundo, também uma luta contra o atual sistema.


É claro que o discurso fascista do governador do Rio de Janeiro Wilson Witzel agrava o problema por empoderar a ação violenta do Estado contra os mais pobres. Mas não podemos nos iludir achando que trocar peças no governo vai resolver o problema. Só vamos resolver o problema quando o sistema mudar. Por que você acha, por exemplo, que não há balas perdidas ou genocídio de negros e pobres em Cuba mesmo sendo esta ilha caribenha um país pobre? Simples: porque lá o capitalismo foi varrido para longe desde a Revolução de 1959. As pessoas precisam parar de se chocar apenas com a corrupção e precisam passar a se revoltar também contra a desigualdade e as injustiças sociais. Aliás, como alguém se atreve a dizer que a corrupção é o maior problema de um país onde milhões de pessoas passam fome? Abra os seus olhos e a sua mente. Enquanto a raiz da violência não for atacada, estaremos sempre enxugando gelo sem entender onde foi que erramos.

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